sexta-feira, 10 de dezembro de 2010

Os tempos áureos do Cinema em Santa Rita Do Sapucaí

O primeiro cinema de Santa Rita do Sapucaí foi inaugurado no dia 10 de março de 1912 onde, posteriormente, funcionou a “Cia. Sul Mineira de Eletricidade”. Antes dele, apareciam por aqui, vez ou outra, alguns ambulantes que alugavam um cômodo do Sr. Chico Balbino para que pudessem exibir os seus filmes.
Como naquela época a energia elétrica ainda não havia chegado à cidade, os equipamentos eram movidos a gás oxilite e éter. Mesmo assim, os mais antigos contam que as projeções dos filmes eram ótimas e que as entradas custavam 4 Cruzeiros.

No dia 22 de maio de 1917, foi inaugurado o majestoso “Cine Theatro Santa Rita”, pela firma “Moreira & Almeida”. Sempre visionário, o jovem Pedro Moreira construiu um prédio digno das grandes casas da capital, com capacidade para 700 expectadores e que contava com 16 camarotes, 16 frisas, 158 cadeiras e espaço para 40 pessoas no balcão.

Em uma rara fotografia do antigo cinema, captada em uma reunião do Partido Integralista, é possível perceber como era a disposição da casa. No andar superior, as famílias mais abastadas pagavam uma quantia anual para terem direito de utilizar os camarotes, que dispunham de 5 confortáveis cadeiras.  No térreo, existiam as frisas e também as cadeiras centrais.

Como o senhor Pedro faleceu muito cedo, sua esposa passou a administrar o local. Marly Fontes, neta do fundador do Cine Santa Rita, conta em sua obra “Casos e Causos” que quando Dona Maricotinha precisava comprar um vestido novo para que suas filhas freqüentassem os bailes, trazia para a cidade os filmes do Tarzan, porque sabia que seria sucesso garantido.
No início da década de 1920, o cinema era tão apreciado pelos santarritenses que, às quartas-feiras acontecia o famoso “Dia Chic”, onde as moças da exibiam, nos intervalos dos filmes, suas ricas e finas “toiletes”. Neste mesmo perído o Sr. Acácio Vilela montou o “Cinema Avenida”, localizado à Avenida Delfim Moreira. No mesmo local, funcionava também uma fábrica de luvas. O estabelecimento não durou muito e encerrou suas atividades no ano de 1925. Até o final da década, o cinema ainda era mudo. Por isso, o Cine Santa Rita dispunha de uma orquestra própria que cuidava de animar a platéia e oferecer vida aos espetáculos. Em uma de suas cartas, datada de agosto de 1930, Glorinha relata a chegada do primeiro filme com som à cidade, mas não consegue esconder o desapontamento diante da péssima qualidade. A verdade é que ninguém conseguia entender nada que estava sendo falado e preferia que o filme continuasse como antes.

Para avisar aos santarritenses que as sessões iriam ter início, existia uma sirene bem no alto do prédio que soava de forma ensurdecedora e podia ser ouvida em todos os cantos da cidade. Cônego Carvalhinho conta em sua obra “Trem de Manobra” que, sempre às sete e meia, o cinema tocava sua sirene e muitos fiéis iam embora da missa. Isso fez com que ele ficasse muito bravo e comentasse sua insatisfação durante a omilia. Com isso, alguns santa-ritenses mais exaltados saíram em direção ao cinema com paus e pedras e ameaçaram destruir o edifício. Glorinha, filha de Maricotinha, relata em uma de suas cartas, datada de 1939, que foi preciso o seu tio Francisco Moreira e outros parentes se colocarem em frente ao prédio. Aos poucos, os revoltosos foram se acalmando e voltaram para suas casas. Alguns dias depois, um princípio de incêndio, causado por uma pane na rede elétrica, danificou o palco do velho Cine Santa Rita. Algumas pessoas chegaram a acreditar que o acidente pudesse ter sido provocado mas, até hoje, nada foi comprovado. Com esse polêmico acontecimento, Dona Maricotinha aproveitou para reformar o estabelecimento e o prédio mudou completamente o seu aspecto.
Enquanto os consertos do Cine Santa Rita não aconteciam, o tradicional Cine-Vitória, dos senhores Miranda e Carletti, passou a contar com um número dobrado de pagantes. Foi aí que outro fato marcante ocorreu. Em um período de cheia do rio Sapucaí, o estabelecimento da Silvestre Ferraz também pegou fogo e fez com que muitas pessoas tivessem que pular nas águas do rio. O número de acidentados foi grande, mas não houveram vítimas fatais.

Com o novo cinema pronto, Dona maricotinha pediu ao Cônego Carvalhinho que abençoasse a casa. As novas formas do edifício ficaram bem próximas do prédio atual. Depois de remodelado, o Cine Santa Rita passou a contar com 3 andares. O terceiro passou a ser conhecido como “galinheiro”. Enquanto os pagantes comuns entravam pela esquerda, os adeptos do “galinheiro” pagavam ¼ do valor e entravam pela direita do prédio. Para garantir o respeito entre os freqüentadores da casa, haviam os temidos “lanterninhas”: dois ou três funcionários que eram contratados para vigiar o ambiente e botar ordem, tanto no galinheiro, quanto nos andares inferiores.

A partir da década de 40, alguns bailes carnavalescos passaram a ser realizados no cinema. Conta-se que, certa feita, o santa-ritense Nilo Silva comprou um saco enorme de confetes para que pudesse lançar sobre as pessoas, lá do segundo andar. Tudo corria bem até que o folião se desequilibrou e despencou lá de cima sobre a multidão. Felizmente, foi só o susto.

Na década de 60, um outro fato envolvendo o cinema gerou grande polêmica. Cerca de vinte estudantes formaram a chamada “fila boba” em frente ao estabelecimento. Uma brincadeira que consistia em fazer uma enorme fila, sem que ninguém entrasse na casa. Quando chegava a vez de comprar o ingresso, os garotos simplesmente saíam e voltavam para o final. Quem presenciou a brincadeira conta que foi mobilizado até mesmo um destacamento de Itajubá para conter os jovens e levar todo mundo em cana.

Nos anos seguintes o número de expectadores começou a diminuir. A casa só enchia uando eram reproduzidos os filmes do Mazaroppi ou dos Trapalhões. Nessas duas ocasiões, era preciso chegar horas antes para não correr o risco de ter que sentar no chão. Com o advento das vídeo-locadoras, o Cine Santa Rita passou a funcionar com um número reduzido de filmes e pagantes. Na década de 90, um movimento liderado pela administração municipal – que hoje detém a posse do prédio - ainda tentou recuperar sua estrutura e construir um palco atrás da telona para que pudesse receber algumas peças teatrais e sessões solenes. No entanto, o estado do recinto passou a se tornar cada vez mais precário e deprimente. Atualmente, existe um grupo liderado pela prefeitura para tentar reativar a casa e atrair recursos financeiros com o objetivo de reformar todo o local. Enquanto isso não acontece, só resta aos santa-ritenses lamentar pelo estado de degradação do recinto e relembrar um tempo em que a nossa comunidade ria, chorava e se emocionava com as aventuras de grandes estrelas.
(Carlos Romero Carneiro)
Texto baseado nas crônicas de Ideal Vieira, Marly Fontes, 
Cônego Carvalhinho e Glorinha Moreira.

Nenhum comentário:

Postar um comentário