terça-feira, 10 de janeiro de 2012

Vida e morte do poderoso senador José Bento

A religião esteve presente na gênese da maioria dos municípios brasileiros. Não por acaso, centenas de localidades receberam nomes de santos católicos, da mais feérica metrópole do país às menores aldeotas sertanejas. A história de Pouso Alegre, como se deduz da própria denominação, não começou com a construção de uma capela e, sim, pela instalação de uma hospedaria para viajantes. Isso não significa que o clero não tenha contribuído para o desenvolvimento da cidade. Pelo contrário: a atuação de um sacerdote do século XIX foi decisiva para que o município fosse projetado e respeitado nacionalmente.
O nome de batismo do padre mais influente de Pouso Alegre era José Bento Leite Ferreira de Mello. Filho de Campanha, veio ao mundo no sexto dia do ano de 1785. Seus pais eram oriundos de paragens mais distantes. O português José Joaquim Leite Ferreira de Mello nascera em Vila de Guimarães e sua esposa, Escolástica Bernardina de Mello, era paulistana. José Bento fez seus estudos primários em Campanha, transferindo-se para São Paulo, em 1807. Na capital fundada pelo jesuíta José de Anchieta, o jovem passou a viver sob a tutela do bispo Dom Mateus. Dois anos depois, recebeu o sacramento da ordem.

Recém-ordenado, padre José Bento já demons-trava habilidade para articulações políticas. Valendo-se da proximidade com Dom Mateus, fez gestões junto ao bispo para a criação de uma freguesia em Pouso Alegre, desmembrada de Santana do Sapucaí (Silvianópolis). Essa era uma reivindicação dos moradores do povoado de Capela do Mandu. Em novembro de 1810, um alvará régio oficializava o nascimento da freguesia do Senhor Bom Jesus de Pouso Alegre, da qual José Bento seria o primeiro vigário.

O envolvimento do sacerdote com a política temporal o transformou num porta-voz dos interesses da elite sul-mineira. Perspicaz e bem relacionado, foi escolhido, em 1821, para o colégio eleitoral que elegeria representantes de Minas Gerais na Corte de Lisboa. No ano seguinte, o imperador Pedro I proclamou a independência do Brasil e tornou-se líder da nova nação, mas José Bento ingressou nas fileiras oposicionistas. O padre-político radicalizou seus posicionamentos anos mais tarde, defendendo, inclusive, a renúncia do monarca. Pedro I acabou abdicando de seu trono em 1831, abrindo espaço para o governo regencial. Sem descuidar dos pleitos de sua região, o líder religioso obteve outra vitória no mesmo ano, com a elevação de Pouso Alegre à condição de vila.    Foi no período da Regência que a carreira política de José Bento atingiu o ápice. Deputado geral por três legislaturas, foi escolhido para o Senado, em 1834. Aproximou-se então do poder central, ganhando a amizade do regente Diogo Antônio Feijó e do líder liberal Evaristo da Veiga, dois dos mais prestigiosos políticos da época. Integrante da bancada do Partido Moderado, o senador José Bento fundou em Pouso Alegre a Sociedade Defensora da Liberdade e Independência Nacional. Expôs ideias liberais no primeiro jornal pouso-alegrense, “Pregoeiro Constitucional”, por ele criado em 1830.
Cruz demarca local onde foi assassinado o Senador José Bento (Bairro Faisqueira).
José Bento colocou seu talento de articulador a serviço de dois movimentos revolucionários, em 1832 e 1842. No primeiro caso, usou as oficinas tipográficas do “Pregoeiro” para imprimir a célebre “Constituição de Pouso Alegre”, que não passou de tentativa frustrada de reforma constitucional. O movimento de 10 anos depois teve sua intensa participação (o plano definitivo para a revolução teria sido traçado na residência do senador, no Rio de Janeiro, que ficava na rua do Conde e era muito frequentada por parlamentares de Minas e de São Paulo).

A atuação legislativa de José Bento exigia dedicação praticamente exclusiva, o que o forçava a passar meses longe de Pouso Alegre. A última viagem do senador à sua base eleitoral aconteceu em fevereiro de 1844. A temperatura do ambiente político estava elevada naquele verão. A caminho de sua fazenda, nas proximidades da vila de Pouso Alegre, o sacerdote foi alvejado com dois disparos e não resistiu ao atentado. O assassinato se deu em circunstâncias misteriosas, colocando sob suspeita adversários políticos de José Bento e até ex-protegidos do senador envolvidos numa disputa por terras.

O desaparecimento prematuro não apagou da memória dos sul-mineiros a marcante carreira política do padre. O nome do senador José Bento ainda hoje ocupa posição de destaque na região, designando a praça principal de Pouso Alegre e um município vizinho.

(Jonas Costa)

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