quarta-feira, 21 de novembro de 2012

Memória dos tempos de escola (Por Ivon Luiz Pinto)


Às vezes eu não consigo entender e, outras vezes, eu nem quero, mas quem vem primeiro: a saudade ou a memória? É a mesma história do ovo e da galinha. A saudade vai chegando sem ser convidada e escancara a porta de nossa vida, acende as luzes de um quarto escuro e desperta a memória que estava dormindo com a cabeça reclinada no travesseiro da história. Ela vasculha o fundo das gavetas e vai retirando pessoas e fatos, rostos e aconte-cimentos. De vez em quando, a gente ri como criança que ganhou um pirulito e, outras vezes, chora como o garoto que perdeu sua bola.
A memória dá a mão para a saudade e, ambas, tecem como duas agulhas de tricô, um emaranhado de recordações. Às vezes, até sem sentido. De vez em quando, a recordação corre pela casa escura de nossas lembranças e nos surpreende,  escondidinho num canto quase esquecido por tanto tempo de espera, um lance  de nossa vida.

Foi assim que aconteceu, num jantar de aniversário, na casa de um amigo, com a família recordando os tempos de estudo no Sinhá Moreira. Professores, alunos, diretores e funcionários, foram aparecendo, chamados pela memória, como uma procissão de fantasmas. Muitos nomes abençoados e lembrados com carinho, mas outros foram lembrados sem muito entusiasmo. Foram lembrados os nomes de Alice Rosa, a Pitotinha, sempre calma, tranquila e, às vezes, até displicente, e suas aulas de geografia. Os nomes me trouxeram lembranças de quando nos reuníamos, no Restaurante Pops, no Casarão ou na própria Escola, para comemorarmos o dia do Professor, com jantar e muita alegria, discursos e poesias. 

Aí alguém começou a contar as travessuras. Sim, eram apenas travessuras, sem nenhuma maldade. Os alunos eram buliçosos, irrequietos, com a impaciência própria da idade, mas nunca faltavam com a educação, sempre respeitadores.

Eu me lembrei de uma onda de bombinhas que estouravam no porão, lá onde havia a merenda escolar, e que aturdia todo mundo. Muitos professores e alunos pulavam de susto e a secretária, muitas vezes, tinha que fazer o documento novamente. Não havia modos de descobrir o responsável ou os responsáveis. O seu João, o Gato, ficava louquinho da silva, correndo desorientado. Tadinho, era um homem simples, bom e prestativo, mas não podia chamá-lo de gato. Corria atrás da pessoa até de canivete em punho. 

Certa vez, vieram dois alunos conversar comigo. Eu era Vice Diretor e gostava muito de bater papo com alunos, mesmo quando estavam de castigo. Eu e os dois  alunos ficamos em papo no corredor que ia para a diretoria, falando coisas comuns e sem interesse. Papear sem sentido, pelo puro prazer de ser e ter companhia. De repente, houve o estrondo. BUMMM! Uma bomba arrebentou no porão. O cheiro acre de pólvora chegou até nós, junto com a fumaça ardida. Os dois se entreolharam, deram um risinho amarelo e disseram para mim:

- Tá vendo, professor? Depois dizem que somos nós que soltamos bomba. O senhor é testemunha, pois estamos aqui...

Verdade, os dois estavam comigo. Mas só isso era verdade. Mais tarde, muito mais tarde, quando já estava aposentado é que o Raimundão veio me contar que eles colocaram o pavio da bomba num toco de cigarro e foram conversar comigo. O estrondo aconteceu com eles longe do local do crime e eu acreditei e, ainda não sei, se era uma verdade pela metade ou uma meia mentira. 

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