terça-feira, 15 de janeiro de 2013

Família Augusto Telles, em quatro gerações


Maestro Augusto Telles
Maestro Augusto Telles com a Lira São Benedito.
Em um mundo sem rádio, net ou televisão, o Maestro Augusto Telles tinha como nobre missão, comandar a “Nova Aurora”. Os integrantes da Lira se reuniam no porão de sua casa e a Rua da Pedra se enchia com uma incrível riqueza de sons. Com ouvido absoluto, canções eram criadas para cada instrumento da orquestra – todos, sem exceção. As exibições, muito aguardadas, eram sempre copiadas, iam para todo o estado e não tinham restrição. Fosse quermesse, procissão ou carnaval, lá estavam os santa-ritenses da Lira, sempre muito afinados, do sopro à percussão. Nas exibições do coreto, após as missas dominicais, uma multidão se reunia para admirar as canções. Como havia duas bandas, mantidas por velhos partidos, a rivalidade era grande e os grupos se desdobravam, para agradar os amigos. 
Maestro, ao centro, com a Lira Nova Aurora.
Com o passar dos anos, o talento de Telles correu e importantes regentes de fora começaram a tocar suas notas. Com uma caneta tinteiro, o Maestro punha as frases na folha. Quando a demanda aumentou, comprou uma pequena gráfica e passou a imprimir caderninhos, vendidos em todo o país. Através de linotipos, a melodia era montada e as letras sempre encaixadas de maneira artesanal. Se errasse uma simples nota, a canção saía trocada e ao menor descompasso, tudo era posto a perder. Para diferenciar os cadernos, cores eram alteradas e as capas ilustradas com vistosos clichês.
Senhor Zito Telles com a Banda Jazz Brasil
José Augusto Telles – o Zito

Grande admirador de seu pai, Zito pedia ao Maestro, que deixasse de fazer manha e o ensinasse a tocar. O velho, entretanto, dizia, que a vida na Lira era dura e que desejava ao menino uma coisa melhor. Não imaginou o talento no sangue e que o garoto herdaria o ofício, mesmo que fosse difícil, querendo o artista ou não. Depois que saía da escola, o rapaz procurava um amigo e sempre com muita humildade, tomava algumas lições. Ao saber do talento do filho, Zito entrou para a banda e sentou-se ao lado de lendas: Zizinho, Cincinato, Alípio, Abílio e Zequinha Major. 
Um dos livros publicados com composições do Maestro.
O requiem do Maestro

Com idade muito avançada, Telles deixou a batuta e a Lira ficou desfalcada daquele grande artista. Dois anos longe da lida, o famoso Maestro morreu e uma grande fila de amigos formou um triste cortejo. Mesmo com a banda montada e os artistas de instrumentos na mão, não havia uma só nota partindo da procissão. Todos estavam calados, exaustos e muito cansados: viam a banda quieta, mas nem imaginavam a razão. Enquanto as senhoras oravam, na Lira pairava o silêncio e, no lugar das cadências, era completo o pesar. Quando alguém perguntava o motivo, um dos queridos amigos, tocado pela agonia, olhava triste e dizia: “Hoje não tem melodia, nossa banda está em luto porque o maestro morreu.”
Instrumento que pertenceu ao Maestro Augusto Telles.
O Correio do Sul

Assim que o “Correio do Sul” foi colocado à venda, Zito cobriu a oferta e seu negócio expandiu. Se de dia fechava negócios, ia ao Clube de noite, para acompanhar sua banda, a famosa Jazz Brasil. Grandes decisões da cidade saíam da redação: casamentos, batizados, notas avulsas e até candidatos à reeleição. Beatriz, sua filha, ainda conta que o cheiro de tinta lhe remete à infância. Seu pai, por outro lado, dizia: “Filha, se aquele ambiente lembra você os tempos de criança, para mim a recordação é maior. É lembrança de toda uma vida, de um trabalho pesado, mas repleto de amor.”

Quando seu filho – Dalton - faleceu, uma forte tristeza o tomou. No dia seguinte à sua perda, Zito, abatido, ao trabalho chegou. Ao ver o amigo quieto, Miranda, seu irmão Maçon, proferiu uma bela frase que, num instante, o acalmou. “Graças a Deus, meu amigo, o trabalho o abençoou. Não há mais nada a ser feito: a hora dele chegou.”.

Décadas depois do Maestro, Luiz Augusto – o filho de Dalton - comprou a Tipografia. Após um acordo com as tias, fechou um grande negócio e a gráfica de quase 100 anos continuou na família. Com mestrado no Inatel marcado, o rapaz trancou o seu curso para tocar os negócios do avô e, junto com outros amigos, criou o Bloco do Urso - famoso em todo o país. Após quatro gerações, coincidência ou não, ele também lida com shows e possui uma boa gráfica, assim como o seu bisavô. Uma vocação que sobrevive ao tempo e que passa de pai para filho.

Agradeço à amiga Beatriz Telles por nos fornecer as informações para a elaboração deste texto e ao amigo Luiz Augusto por nos emprestar fotos e documentos que pertenceram ao seu avô. A todos os seus familiares o nosso abraço e reconhecimento.

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