quarta-feira, 22 de janeiro de 2014

A trajetória da família Costanti - Por José Antônio Justino Ribeiro

No dia 16 de novembro passado, foi realizado em Santa Rita um importante encontro dos familiares do casal de imigrantes italianos Francesco Giuseppe Enrico Costanti e Maria Ezília Grize Benvenuti. Reuniram-se no Espaço Costa cerca de 150 pessoas, contando seus des-cendentes e respectivos agregados. A intenção era relembrar a história dessa família e de sua consolidação no território brasileiro, onde chegaram há 106 anos. 
Enrico e Ezília, como eram mais conhecidos, chegaram a São Paulo em 26 de abril de 1897. Traziam pouquíssimas coisas, uma filha chamada Iva, de pouco mais de um ano de idade, e grandes esperanças. Vinham da região da Toscana e o objetivo principal era o de fazer a América. Este era o jargão usual dos imigrantes buscando progresso pessoal e familiar que lhes permitisse retornar à terra natal com melhores condições econômicas e financeiras. Como nas descrições de muitas famílias, encontram-se fatos que valorizam de maneira des-tacada a contribuição que deram para as comunidades. Vários documentos originais, ainda guardados com alguns de seus descendentes, comprovam a incessante luta que empreenderam durante toda a vida. 

O patriarca Enrico é oriundo da comuna de Calci, na província de Pisa. Foi possível levantar sua história até o nascimento e os primeiros anos da vida de seu pai, Giácommo Costanti, e de sua mãe Cherubina Martini. Muitos dos relatos foram registrados a partir de informações transmitidas oralmente pelos membros mais velhos da família. Assim, a história de Enrico inicia-se com seu pai em um pequeno orfanato religioso em sua terra natal.

Era usual em muitas nações a existência dessas organizações religiosas, geralmente administradas por freiras ou por frades. Nesses locais, encontravam abrigo crianças que perdiam os pais ou cujos pais renunciavam à sua criação por dificuldades financeiras ou, ainda, quando se tratassem de filhos de mães solteiras, sem condições de sustentá-las. Nos muros que separavam os conventos do ambiente externo, havia sempre uma roda capaz de ser girada manualmente em um pequeno espaço. Sobre ela instalava-se um cesto que pudesse abrigar uma criança pequena ou um recém nascido de famílias com aquelas difi-culdades. Essa roda era, então, girada de maneira que a criança passasse para o interior do muro do orfanato. No Brasil e em outros locais de colonização portuguesa esse recurso era conhecido como roda dos enjeitados. 

Os responsáveis pelo orfanato registravam a data correta de recolhimento da criança, suas características principais, eventuais sinais de nascença, etc. Geralmente, acrescentavam algum sobrenome que remetesse à proteção divina ou da igreja. Nos países de língua portuguesa, por exemplo, eram incluídos sobrenomes como Dos Santos, do Espírito Santo, de Deus, etc... Na Itália, apareciam como Innocenci, Della Chiesa (Filhos da Igreja), entre outros. Segundo relato feito por Enrico, seu pai, Giácommo, havia sido colocado na roda dos enjeitados e permaneceu no orfanato por algum tempo. Certo dia, o pai do menino foi até o local e tinha em mãos todas as informações a respeito do dia e horário em que fora depositado na roda, as características da criança e outros dados. Com isso, ficou fácil a sua identificação e Giácommo foi retirado do orfanato, reconhecido e devidamente registrado na família. Segundo relatos, se permanecesse até sua saída na época oportuna, levaria o sobrenome de Innocenci. 
Giácommo Costanti casou-se com Cherubina Martini, cuja família era conhecida como I Cantanti (Os Cantores), artistas itinerantes que se apresentavam em diferentes locais, sempre por pequenas temporadas. Dessa união, nasceu Enrico, em 1872, no lugarejo chamado Montemagno, pequena fração da comuna de Calci. Aprendeu o ofício de curtidor, que exerceu por toda a vida, e serviu o exército italiano entre 1893 e agosto de 1894, no distrito militar de Livorno. A história da matriarca Ezília começou a ser registrada com seus avós Benvenuti Di Lorenzo, do lado de seu pai, e Bernardo Batistoni e Luisa Borgi do lado materno. Ezília nasceu em 29 de janeiro de 1877 e tinha cinco irmãos mais velhos e quatro mais novos. Casou-se com Enrico, em 1895, na mesma comuna de Calci. 

Por essa ocasião, havia pouco tempo que ocorrera a unificação da Itália e o resultado dos movimentos políticos e revolucionários foi uma nação empobrecida. Não se encontravam muitos empregos, geralmente a remuneração era baixa e havia grandes dificuldades para muitas das profissões. Enrico e Ezília foram trabalhar em curtume da família de Ezília, localizado às margens do rio Arno. Eventuais desentendimentos, associados às ações que estimulavam as migrações, levaram o casal a optar pelo Brasil. As facilidades para imigração visavam substituir na lavoura a mão de obra escrava recentemente abolida. Como Enrico tinha profissão especializada, fixou-se, inicialmente, em São Paulo, onde nasceu, em 1898, o primeiro filho brasileiro, Ivo Costanti. Nesse mesmo ano falecera a primogênita, Iva. 

A partir desse local, sempre em busca de melhores condições para a família, Enrico e Ezília mudaram-se para várias cidades, como Serra Negra, Pouso Alegre, São Roque e outras. Em algumas delas, nasceram os demais filhos brasileiros: Rosalino Giuseppe, Armando, Antônio João, Minotti Giovanni, Orlando Glycério, Gino Giácomo e Victorio Henrique. A família chegou a ter uma situação econômica confortável, até que todo o estoque de couros produzido por Enrico foi destruído em uma enchente que aconteceu em grande parte do sul de Minas Gerais, por volta de 1926. Desgostoso e sem condições de recuperação, faleceu em Santa Rita do Sapucaí em 15 de janeiro de 1939. Tivera várias complicações em decorrência de um acidente vascular cerebral. No final da década de 1940, mais exatamente em 1948, Ezília faleceu em São Paulo. 

Dos filhos, Ivo, Armando e Rosalino seguiram a profissão do pai e foram curtidores. Minotti Giovanni, Antônio e Victorio foram construtores e marceneiros. Gino era alfaiate e Orlando foi mecânico a partir dos 15 anos. Inicialmente, residiram em várias cidades do sul de Minas como Pouso Alegre, Itajubá, Santa Rita do Sapucaí e São Gonçalo do Sapucaí. Mais tarde, Armando mudou-se para Cruzeiro, onde faleceu em 1961. Ivo passou a residir em Mauá, nas proximidades de São Paulo, até sua morte em 1963. Rosalino viveu a maior parte da vida em São Gonçalo e morreu de uma parada cardíaca em 1962. 

Orlando saiu de casa aos 16 anos, primeiro como auxiliar de mecânico de uma empresa de mineração. Percorreu muitas cidades, casou-se em Itajubá, onde nasceram seus filhos. Depois, mudou-se definitivamente para Santa Rita do Sapucaí e trabalhou na profissão até a véspera de sua morte em 1985, três dias após completar 73 anos. Antônio João, Minotti Giovanni, Gino Giácomo e Victorio Henrique viveram quase sempre em Santa Rita, onde nasceram seus filhos. No levantamento para a reunião da família, constatou-se que os diversos ramos agrupavam 491 membros, entre descendentes de Francesco Giuseppe Enrico Costanti e Maria Ezília Grise Benvenuti e os agregados. 

A festa de reencontro esteve animada e reuniu quatro gerações com membros vindos de várias partes do Brasil. O mais velho dos presentes, filho de Ivo Costanti, tem 83 anos e o mais novo apenas três meses. Parentes que se conheciam de longa data puderam se abraçar novamente e muitos se viram pela primeira vez, naquele momento, todos embalados em uma alegria contagiante. Foi um evento mágico, de felicidade e satisfação estampadas nos rostos de todos. Demonstravam o orgulho e a gratidão de serem Costanti e de terem recebido tão importante legado de seus antepassados. A tarde passou rápida, com muita dança ao som contínuo, alegre e persistente da Tarantella.  

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