segunda-feira, 20 de janeiro de 2014

O talento extraordinário do santa-ritense Jander Abdala

Desde criança, Jander Abdala se enveredava pelas propriedades rurais de Santa Rita do Sapucaí e ficava encantado com a vida simples do homem do campo. Uma de suas lembranças mais antigas é de um passeio que fez pela Fazenda Delta, construída pelo Coronel Joaquim Inácio, onde um bom número de pessoas se enfileiravam para se tratar com um velho índio curandeiro, habitante daquelas bandas.
Enquanto passava pelas pequenas casas dos colonos, o garoto prestava atenção nos detalhes e percebia que, apesar de humildes, aquelas pessoas detinham uma técnica avançadíssima para lidar com a madeira. “Notei que eles não usavam prego para construir. As madeiras eram todas encaixadas ou, como eles diziam, minhotadas.”

Ao completar 20 anos, Jander já estava decidido a construir uma casa utilizando aquele método de tratamento e encaixe de madeiras rústicas. Como fizeram os construtores no final do Século XIX, o rapaz queria utilizar apenas ferramentas simples, tais como formão, martelo e serrote. Absolutamente leigo no assunto, começou a “garimpar” madeiras de qualidade nas fazendas da região e comprou seu primeiro material do senhor Mauri Marques, que acabava de demolir um paiol. A segunda leva foi adquirida após a demolição da centenária casa grande da Fazenda Delta, de onde trouxe grandes colunas de peroba rosa – utilizadas na confecção de sua porta de entrada e das lindas janelas que adornam a residência (vide capa).

Em um ritual meticuloso e solitário, Jander saía do trabalho no final da tarde e caminhava em direção à construção, onde trabalhava até 10 da noite. Com peças de uma plantadeira, o artesão construiu os puxadores da porta de cedro. As dobradiças da antiga Delta, também foram mantidas em sua nova residência. Réplicas de grandes fechaduras também foram confeccionadas para enriquecer o local. Com muita paciência, cada detalhe foi minuciosamente estudado para que seu sonho fosse concretizado.
Quando suas madeiras tornaram-se escassas, Jander soube que havia uma peroba de 10 metros e meio, proveniente de um velho paiol demolido em uma propriedade rural e negociou a relíquia em troca de eucalipto serrado. Com o tempo, passou a conhecer o valor da matéria-prima que utilizava e tornou-se grande conhecedor da técnica que empregava.

De todos os pontos da casa, completamente arquitetados por Jander, sua grande paixão é uma escadaria, toda produzida através da sobreposição e encaixe de grandes peças de peroba rústica. Os corrimãos, por sua vez, também foram produzidos em madeira e tiveram os adornos criados pelo próprio construtor.

Ao finalizar a residência, o rapaz deu início à construção da área de lazer, onde cada detalhe carrega uma rica história. A base da construção foi feita toda em pedras – vindas de cachoeirinha. O pórtico de entrada é o mesmo da antiga sala da Fazenda Delta. Os tijolos, retirados de uma casa demolida na rua Silvestre Ferraz, foram deixados “à vista”. Já o engradamento, foi adquirido durante uma reforma da Escola Estadual Doutor Delfim Moreira e data de sua construção.
Encostados num canto, ao lado do fogão de lenha que acaba de ser erigido, estão dispostos os grandes portais que pertenceram à Igreja de São Benedito, à espera para serem utilizados em alguma etapa do processo de transformação da madeira descartada em objetos requintados. “Madeiras que parecem perdidas, são recuperadas através de um tratamento de restauração. Aqui, nada é descartado.” – explica.

Quando deu início à construção dos móveis, Jander manteve a harmonia do ambiente. Um carro de boi, herdado do senhor Vitor Teixeira deu origem a uma mesa redonda. Outras peças do veículo serviram de adorno para a lareira. Com um barril, cortado ao meio, criou a base de um balcão para o seu bonito barzinho. A mesa de jantar foi construída com cedro e peroba, enquanto as cadeiras de três pernas foram confeccionadas em Guatambu. O mesmo critério foi adotado na produção do guarda-roupa e da cama.

Enquanto realiza suas intervenções, tudo é acompanhado de perto por sua esposa, Fânia. Para a construção dos móveis, Jander recebe auxílio de um marceneiro muito talentoso, conhecido como Francisco Jonas. Para a confecção de réplicas em metal, Jander também conta com a atuação de um serralheiro chamado Paulo. De resto, tudo é feito por ele.
“Para mim é uma higiene mental muito grande. Eu passo a semana inteira trabalhando na Leucotron e, quando chega o final de semana, vou direto para a obra. Este processo não tem fim e recursos para materializar os projetos não faltam. Se tivermos a consciência de usar o que já está cortado, jamais teremos que derrubar uma árvore. Este trabalho me realiza.”

Por Carlos Romero Carneiro

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